Muitos leitores mais clássicos provavelmente já ouviram falar sobre esse livro, mas poucos sabem de fato a mensagem que é transmitida e os ...

(Resenha) Ensaio Sobre a Cegueira

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Muitos leitores mais clássicos provavelmente já ouviram falar sobre esse livro, mas poucos sabem de fato a mensagem que é transmitida e os sentimentos que o leitor é forçado a ter durante a leitura.

Sendo uma obra do José Saramago, o autor preferiu manter a ortografia vigente em Portugal mesmo nas edições brasileiras, ou seja, aparecem algumas palavras novas e acentos usados de forma diferente, mas isso apenas enriquece a obra, deixando-a mais original.

        A história se baseia em um vírus que subitamente está deixando as pessoas cegas, exceto a Mulher de um médico, que finge estar cega para acompanhar o marido nos estabelecimentos criados pelo governo, e é a partir do que ela vê que a obra é retratada. O diferencial é fazer o leitor sentir e imaginar como seria a vida de um cego, ou melhor, a vida de uma pessoa que ficou cega de repente. Além disso, ocorrem acontecimentos angustiantes, cruéis, e verdadeiros, mostrando até que ponto o ser humano é capaz de fazer para sobreviver ou se manter no topo.

Sinopse:
Um motorista parado no sinal se descobre subitamente cego. É o primeiro caso de uma "treva branca" que logo se espalha incontrolavelmente. Resguardados em quarentena, os cegos se perceberão reduzidos à essência humana, numa verdadeira viagem às trevas.
O "Ensaio sobre a cegueira" é a fantasia de um autor que nos faz lembrar "a responsabilidade de ter olhos quando os outros os perderam". José Saramago nos dá, aqui, uma imagem aterradora e comovente de tempos sombrios, à beira de um novo milênio, impondo-se à companhia dos maiores visionários modernos, como Franz Kafka e Elias Canetti.
Cada leitor viverá uma experiência imaginativa única. Num ponto onde se cruzam literatura e sabedoria, José Saramago nos obriga a parar, fechar os olhos e ver. Recuperar a lucidez, resgatar o afeto: essas são as tarefas do escritor e de cada leitor, diante da pressão dos tempos e do que se perdeu: "uma coisa que não tem nome, essa coisa é o que somos".
Resenha:
Nos primeiros capítulos é retratado como a cegueira branca chega nos personagens principais que são os primeiros afetados (os quais não possuem nome, que são atendidos como “médico”, “motorista”, “rapariga” e etc), exceto a Mulher do médico, que o acompanha para o manicômio desativado que o governo providencia para alojar os “novos” cegos. 

No início, esse mesmo grupo se organiza no local com regras, turnos para buscar os mantimentos, como podem se ajudar, ou seja, começam a estabelecer ordem no local. Com a chegada de mais cegos, essa ordem é colocada em prova e vai se tornando cada vez mais difícil manter regras e conviver com pessoas desesperadas e indiferentes com a situação. De repente os mantimentos que eram enviados pelo governo começam a ser distribuídos em menor quantidade, enquanto o número de cegos apenas aumentava, começando a criar a principal discórdia do livro, pois a sobriedade humana começa a ser testada.

“-É desta massa que nós somos feitos, metade de indiferença e metade de ruindade. ” (Pág. 40)

Um grupo de cegos mais violentos de um determinado bloco recolhe e manipula a última leva de alimentos, exigindo pertences de valor em troca dos alimentos. Para fazer a contagem, um cego de nascença usava um aparelho apropriado, levando vantagem sobre todos daquele manicômio, pois já possuía os sentidos mais aguçados e mais adaptado a tudo aquilo. Quando acabam todos os pertences, o grupo exige turno de mulheres de cada bloco, independentemente da idade, condição de saúde ou estado civil. E esse é o momento mais esdrúxulo que o livro demonstra, pois retrata a angústia dos homens com toda aquela animalização, além do desespero da Mulher vendo toda aquela cena sem poder fazer nada, e ao mesmo tempo se conscientizando de que a hora do seu bloco estava próxima. É nesse mesmo momento em que o livro se torna rico de reflexões e força o leitor a examinar todas as passagens já lidas, para que no final se pergunte se aquilo mesmo é possível, se de alguma maneira o ser humano pode se tornar algo tão cruel e egoísta
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 “-Mas quando a aflição aperta, quando o corpo se nos desmanda de dor e angústia, então é que se vê o animalzinho que somos.” (pág. 243)

Na segunda noite em que isso ocorre, a Mulher do médico procura alguma forma de acabar com isso, e vendo uma oportunidade, rouba a faca do líder do grupo e o mata, causando desordem em todo o manicômio. Um incêndio começa no local, os gritos de socorro para os seguranças que já fazia tempo que não estavam lá, as grades e portas fechadas, o medo de atravessar o gramado e ser fuzilado, até que sem opções e levados pelo desespero, os cegos começam a arrombar os portões e passar pelas grades em direção da liberdade. 

“-O medo cega... são palavras certas, já éramos cegos no momento em que cegamos, o medo nos cegou, o medo nos fará continuar cegos.” (pág. 131)

Na passagem final do livro, o grupo dos primeiros capítulos ficam juntos novamente para encarar uma cidade tomada pela epidemia, com mercados vazios, casas arrombadas, ruas desertas, familiares cegos e se perguntam até quando vai aquele pesadelo. Até que com o passar de alguns meses, o primeiro cego começa finalmente a distinguir as cores, as silhuetas, os objetos, as pessoas, e percebe que está enxergando novamente.

Opinião: 

Essa obra não foca em como a epidemia começou e terminou, mas foca nos momentos e decisões surreais em que o grupo precisa tomar, os acontecimentos sub-humanos e o inimaginável. É como se Saramago jogasse no colo do leitor todas as informações que ele precisa e falasse “Agora você que tire as próprias conclusões”, o que particularmente achei genial, pois cada leitor vai conseguir extrair uma essência diferente do livro. No meu caso, fiquei me perguntando se já não estamos cegos, ou então, que vemos, mas não enxergamos o significado de cada momento, objeto ou pessoa. Que não damos valor aquilo que é realmente belo, e nos estressando na mesmice de sempre. Afinal, damos valor às coisas quando elas se perdem, o que demonstra que não enxergamos de fato o que ela pode transmitir. Aconselho então a todos lerem essa obra angustiante e fatídica para que no final encontrem a sua própria conclusão.

"Por que foi que cegamos, Não sei, talvez um dia se chegue a conhecer a razão, Queres que te diga o que penso, Diz, Penso que não cegamos, penso que estamos cegos, Cegos que veem, Cegos que, vendo, não veem."  (pág. 310)


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